quarta-feira, 15 de abril de 2009

Interrupção Voluntária(?) da Gravidez

Citando novamente a minha prezada mãe (a quem desde já agradeço ter permitido o meu nascimento): “A minha liberdade termina quando a do outro começa.”
Há uns tempos a interrupção voluntária da gravidez, o aborto, era o tema do momento. Nunca percebi o que havia para discutir e deixei de assistir a todos os debates uma vez que a poluição sonora e visual era de um nível absolutamente insuportável. Nada como um bom debate para evidenciar a já inúmeras vezes referida estupidez humana.
De entre o infinito rol de barbaridades a que os meus adorados canais auditivos estiveram sujeitos durante essa fase infernal, houve uma frase constantemente proferida pelos defensores do "sim" que se destacou e ficou gravada no meu cérebro (tenho o péssimo hábito de não limpar o spam cerebral): “A mulher tem o direito de fazer o que quer com o seu corpo, o corpo é dela, ela é que decide.” (Citando milhões de organismos com deficiências neuronais.)
Vou deixar um parágrafo em branco em “homenagem” a esta pérola de sabedoria.



Continuando. Óvulo fecundado, gravidez. Ponto assente. Não sei a partir de que ponto de uma gravidez é que as mulheres se sentem mães mas apesar de nunca ter engravidado acho que qualquer pessoa com o mínimo de instinto maternal se sentiria dessa forma a partir do momento em que se confirma o seu estado de graça (ou não, dependendo do ponto de vista). Chamem-me sensível, quiçá.
Segundo a lei portuguesa, a interrupção da gravidez por opção da mulher pode ser efectuada nas primeiras 10 semanas de gestação. Não sei se já tiveram curiosidade em ver imagens de um feto com 10 semanas. Dados os meus níveis de curiosidade, averiguei rapidamente. Não é uma criancinha adorável, rosadinha, com uns tufinhos de cabelo, uns olhinhos brilhantes e um sorriso irresistível, não, mas já se vê perfeitamente o formato do corpo, incluindo todos os dedinhos. Pelos vistos a aparência é sempre o factor determinante, afinal começa mesmo no útero. Não tem o aspecto apetecível ainda, não faz caretas nem se notam os traços do pai, não toca o coração, é dispensável. Como é coerente o ser humano.
Tanto quanto sei ainda não há um consenso em relação à existência ou ausência de sensações fetais durante o processo de abortamento. Há quem diga que o feto é capaz de sentir dor a partir da sétima semana e quem defenda que os requisitos neuro-anatómicos necessários para que se sinta dor só se formam a partir do segundo ou terceiro trimestre.
Mas dores à parte, mesmo que o feto não sinta dor alguma: será que é assim tão difícil alguém perceber que um feto é OUTRO ser?!!?! Que não é um órgão do corpo da mulher mas sim OUTRO ser humano a residir temporáriamente no mesmo?!?! É uma noção assim tão difícil de encaixar?? Seguindo esta lógica digna de um nobel..sendo assim qualquer pai ou mãe tem o direito de violar os seus filhos, espancá-los e até mesmo matá-los enquanto estes viverem na sua casa, não? A casa é deles, a prole só habita no mesmo espaço, façam deles o que quiserem. É a mesmíssima lógica nobeliana.
Nos tempos que correm acho que a probabilidade (para uma pessoa minimamente inteligente e informada, logicamente) de uma gravidez não planeada é equivalente à de acertar a chave no euromilhões. Cada acção tem uma consequência e acho que temos de ser responsáveis por elas, sejam elas quais forem. Assim, se geramos uma criança somos responsáveis por ela, agora, não me parece que uma criança tenha culpa da falta de neurónios dos seus progenitores. Eu percebo que à partida a probabilidade da mesma de se tornar um ser extremamente dotado de inteligência seja reduzida devido à herança genética mas se formos exterminar todas as pessoas menos favorecidas intelectualmente do mundo a população mundial caberia confortavelmente num país do tamanho de Portugal.
Outra coisa caricata. Apenas a própria mulher pode fazer o pedido de interrupção da gravidez, a não ser que seja psiquicamente incapaz. Mais alguém nota a redundância?
Agora pergunto: se para se formar o embrião é fundamental a presença um óvulo e um espermatozóide...por que carga de água é que só o óvulo é que tem voto no extermínio?! Divórcios de milhões, divisão de bens, etc. Embrião, é de quem tiver óvulos. Um casal compra uma casa em conjunto, um carro....separam-se, fazem-se as contas, metade para cada um (em princípio), pelo menos há sempre divisões. Agora, gravidez, a mulher é que decide, o homem mesmo que queira ficar com a descendência não adianta nada, a mulher é que decide. Tem voto no carro, mas no assassinato do rebento não. Fantástico.
Acho fascinante como a eutanásia é proibida mas o aborto é permitido. Uma pessoa autónoma com capacidade mental não pode pôr fim à sua vida em caso de sofrimento irreparável, é obrigada a passar o resto da sua vida (que espera que seja curta) em agonia mas uma pessoa dependente que não pode objectar nem dar o seu parecer (e que provavelmente espera que a sua vida seja longa), pode ser condenada à morte por um outro ser, que detém poder total. Ultrapassa-me.
Vou ser sincera, o que não falta por aí são pessoas cujas mães deveriam ter optado pelo aborto, é uma pena que não o tenham feito. Eu seria a primeira pessoa a favor do aborto caso fosse possível adivinhar o futuro e ver no que se transformaria o feto. O problema é que tanto quanto sei, as bolas de cristal são só bolas de cristal e sendo assim, ao serem gerados, todos têm o benefício da dúvida e o direito à vida.
Li no outro dia um artigo sobre a quantidade de mulheres que perdem a vida nos abortos induzidos, perto de uma centena de milhar por ano. Dizia ainda que a probabilidade de desenvolvimento de cancro de mama aumenta com esta prática e pouco mais. Continuei a procurar o resto do artigo, a parte referente ao número de crianças que são assassinadas anualmente ainda no ventre, pelas próprias mães, por todo o mundo mas curiosamente não encontrei, provavelmente foi algum problema de edição.
Interrupção voluntária da gravidez..ou será interrupção involuntária da gravidez, já que "o interrompido" não teve voto na matéria?
Talvez seja a minha noção de maternidade que seja um pouco diferente, talvez seja mesmo uma pessoa muito antiquada como os adeptos do "sim" costumam orgulhosamente dizer mas se ser antiquado é achar horripilante que a pessoa que nos gera e que deveria ser o nosso porto seguro, o maior vínculo afectivo que se pode ter e a pessoa que mais amor por nós deveria nutrir, ser essa mesma pessoa a optar por nos enviar cano abaixo como um simples apêndice incómodo, então meus caros, tenho todo o gosto em afirmar que sou antiquadíssima e com muito orgulho.